sábado, 8 de dezembro de 2007

Uma vida pela vida

Um assunto não saiu da minha cabeça nos últimos dias: o jejum de Dom Luiz Cappio, bispo diocesano de Barra (BA), contra o Projeto de Transposição do Rio São Francisco.
O Frei reiniciou a greve de fome em Sobradinho (BA), ao pé da barragem, chamando a atenção para o estado em que se encontra o rio. O lago vem diminuindo suas reservas e encontra-se com menos de 14% da sua capacidade. Como as obras da transposição começaram e o diálogo com o governo foi interrompido, ele retomou o jejum dois anos após os 11 dias que passou sem comer.
Não vou discorrer sobre a mudança do percurso do rio. Mas esse contexto faz lembrar a história de vida da minha família.
Nasci numa cidade que fica às margens do Rio São Francisco (Sento-Sé, a 689 km de Salvador) e meus pais, em outra que foi inundada pela construção da Barragem de Sobradinho (Casa Nova). Na época, em 1977, o projeto parecia ser a solução para todos os problemas, pois permitiria a acumulação das águas do rio para regularizar o fornecimento às usinas do complexo hidrelétrico e possibilitaria a agricultura irrigada em escala empresarial. Era o período da ditadura militar e do milagre econômico e a população, sem instrução para medir as conseqüências desse ato violento (e muito sonhadora), embarcou, deixando tudo para trás, rumo a um desconhecido-tentador.
Foram desalojadas cerca de 12 mil famílias, num total aproximado de 72 mil pessoas. Meus pais não tiveram escolha. Pegaram o que podiam carregar em barcos, carroças e pau-de-arraras e saíram da cidade antes de presenciar a inundação. A única alternativa era, ao menos, decidir o destino, em qual das novas localidades criadas pela Chesf eles iam viver. Preferiram Sento-Sé. E foi lá que eu nasci, anos após a mudança.
Dias atrás, minha mãe disse que a modificação, apesar de ter sido muito sofrida, foi benéfica para nossa família, pois possibilitou a educação dos seus 8 filhos (isso mesmo. Tenho 7 irmãos. Meus pais não tinham televisão. Hehe). Mas e os trabalhadores rurais que viviam da pesca e da criação de animais? Eles sim sofreram com a migração involuntária. E é para eles que se voltam minhas preocupações. O rio está secando e nenhum trabalho de revitalização foi feito.
A greve de fome do Frei é incompreensível para muitas pessoas e pode parecer uma chantagem para o governo, mas é um ato heróico. Na carta enviada ao presidente Lula, Dom Luiz diz: “Quando a razão se extingue, a loucura é o caminho”. Uma loucura digna, destinado a poucos. O argumento de que a greve de fome atenta contra a própria vida não me convence. É pela vida do seu rebanho que o bispo arrisca sua vida. Ele tornou-se voz daqueles que não a possuem. Quantos fariam o mesmo?

3 comentários:

Samy Teixeira disse...

Infelizmente as pessoas hoje estão muito egoístas, creio que poucas pessoas fariam o que o Frei está fazendo, pois elas só estão preocupadas consigo mesmas... se não atigirem não se incomodam... isso é triste.. muito triste...

Anônimo disse...

Good question... quantas hj fariam isso??
Rpz,olha a história da migração e da megalópole Sento-Sé sendo contada por vias internáuticas...quem diria!!!hauahauhauah

.raphael. disse...

Poucos fariam o mesmo, pode ter certeza! Mas desses poucos, muito menos o presidente!..hehehe

é uma questão difícil, e se não foi resolvida a anos, como muitas coisas aqui nesse país, eu não tenho esperanças de que sejam resolvidas, infelizmente!

Mas enfim, nunca se pode deixar de torcer!

bjaoo